sexta-feira, dezembro 30, 2005
Coisas de valor, e o valor das coisas
As coisas são sempre elas, coisas. O que muda é o sentimento que guardamos por elas. Aí deixam de ser coisas, se tornam bens, relíquias, lembranças. Algumas vezes é o momento ou instante que determina sua importância, sua associação à determinada pessoa ou situação.

Se me fizessem a pergunta "Num incêndio em sua casa, na hora de escolher algo de material, o que salvaria?", com certeza minha resposta seria: um livro. Provavelmente morreria na tentativa, pois guardo uma estante completa só com os prediletos.

São meus amigos, professores, confidentes. As portas para as mais variadas e insólitas viagens, através das mãos e pensamentos de pessoas tão diferentes, ou ainda iguais a mim. Meus livros são minhas relíquias, meu tesouro e herança, o conjunto mais precioso dos meus bens.

Em minha família sou a única com o hábito de leitura, descontando os leitores de gibi (não é uma crítica, também devoro gibis). Mas foi olhando para minha avó que realmente percebi essa relatividade de valores. Dona Jovelina, 87 anos, não lê nem escreve, mal assina o próprio nome. Para ela, meus livros são somente enfeites coloridos dispostos nas estantes, e só. Em toda a sua vida de custoso trabalho na roça, o que nunca lhe pesou foi a falta dessa cultura. Educou os filhos da melhor maneira que pôde, em uma época onde os estudantes precisavam apagar a lição copiada no dia, para ter onde anotar a do dia seguinte. Hoje entendo melhor o real significado de um simples caderno para minha mãe, após ela me abrir esse dedinho de seu baú de recordações.

São bens com mais importância para uns, menos para outros, dificilmente com mesmo peso e lembranças. Posso sentar com minha avó e lhe contar histórias que ecoam através dos tempos, falar de Shakespeare, Pirandello, Veríssimo, Rosa e tantos outros nomes os quais ela nunca ouviu falar e que nem saberia repetir. Posso apontar mapas de lugares conhecidos, possibilidades infinitas de viagens, olhares.

Mas a minha avó possui para mim, que espero um dia viver de escrever, o bem mais precioso do mundo, quase o meu copo d'água no deserto: a vivência. A pessoal, não a emprestada como a maioria de minhas leituras. Suas memórias, suas vicissitudes e alegrias impressas em cada ruga, em cada sinal. E o brilho nos olhos de alguém que já viveu muito, e ainda tem muita história pra contar. Como um bom livro.

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postado por Aleksandra Pereira às 12:43 AM |


2 Comentários:


At sexta-feira, dezembro 30, 2005 2:44:00 AM, Anonymous Anônimo 

Como é bom darmos valor às coisas aparentemente pequenas...

At domingo, janeiro 01, 2006 4:44:00 PM, Blogger Fabiano Roberto 

viver é uma grande aula, só é preciso prestar atenção.
gostei muito do seu blog.
feliz 2006!
beijos ! ! !



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