sábado, novembro 24, 2007
Papo sério
Começar esse post foi difícil, mas com o passar dos minutos a vontade de escrevê-lo cresceu.

Queria dar uma justificativa para o meu afastamento do blog, para todos os incríveis companheiros de leitura que conquistei desde que o “Lágrimas” nasceu, e fui percebendo que precisava me justificar também para amigos próximos e, principalmente, para mim.

Não foi só daqui que me afastei. Ultimamente estive afastada de tudo. Perdi oportunidades, festas, até amigos, que entenderam falta de interesse ou carinho.

Sempre fui uma pessoa tímida. Desde pequena a principal característica era um livro nas mãos, óculos no nariz e silêncio. Nunca me senti sozinha assim, mesmo sabendo que precisava interagir mais com as outras crianças. E olha que eu brinquei muito de ”Rouba Bandeira”, “Taco”, “Queimada”, cheguei a montar um grupo feminino cover do “New Kids on the Block” (é ridículo, eu sei!), e comecei a “interagir” cedo com... rapazes. Uma garota normal.

Mas sempre carregava nas tintas da melancolia. Como parecia ser um traço da minha personalidade e não me atrapalhava em excesso, segui assim. Com o passar do tempo e a soma de fatores sérios como constantes crises de enxaqueca, me parecia mais do que normal me resguardar, preferir a tranqüilidade, admirar o silêncio. Aproveitei bem minha adolescência, poderia entrar na idade adulta mais calma, sem arrependimentos por algo que não tenha feito.

Mas as crises de enxaqueca aumentaram, e com elas a quantidade de nomes de remédios e médicos. Junto aos Machado, Woolf, Calvino, as bulas eram lidas com minúncia – pesquisadas, perguntadas, contestadas. E com a troca de remédios que ajudavam pouco – ou que atrapalhavam outro tanto – novos sintomas foram aparecendo: tristeza constante, falta de energia, irritação, insônia ou excesso de sono.

Aí para quem passa também por isso tudo vira uma bola de neve com você dentro, sem saber onde começa e termina alguma coisa: a auto-estima vai para o pé, fica difícil se concentrar ou tomar decisões, e o sentimento de falta de esperança cresce – não só ele, a gente também, pois o desconto na comida faz com que o peso aumente, diminuindo mais ainda a auto-estima, perdendo a esperança e...

Pois é.

De lá para cá já procurei inúmeros médicos, tomei fórmulas, remédios, tive crises de enxaqueca, de pânico, até crise por ter crises.

Aí começo a ouvir falar bastante sobre DEPRESSÃO. “Fulano tem depressão e não sai da cama”, “Sicrano se matou por causa da depressão”.
Putz. Será que é isso o que eu tenho?

Pesquisando, descobri que, segundo o DSM-IV - Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (4ª edição), existem alguns critérios para se diagnosticar uma depressão. Criaram uma tabela e dela, cinco ou mais dos sintomas relacionados devem estar presentes. Dentre eles, um é obrigatório: estado deprimido ou falta de motivação para as tarefas diárias, há pelo menos duas semanas – detalhe: eu falo de ANOS. Os sintomas são:

- Estado deprimido: sentir-se deprimido a maior parte do tempo;
- Anedônia: interesse diminuído ou perda de prazer para realizar as atividades de rotina;
- Sensação de inutilidade ou culpa excessiva;
- Dificuldade de concentração: habilidade freqüentemente diminuída para pensar e concentrar-se;
- Fadiga ou perda de energia;
- Distúrbios do sono: insônia ou hipersônia praticamente diárias;
- Problemas psicomotores: agitação ou retardo psicomotor;
- Perda ou ganho significativo de peso, na ausência de regime alimentar;
- Idéias recorrentes de morte ou suicídio.

De acordo com o número de itens respondidos afirmativamente, o estado depressivo pode ser classificado em três grupos;
1) Depressão menor: 2 a 4 sintomas por duas ou mais semanas, incluindo estado deprimido ou anedônia;
2) Distimia: 3ou 4 sintomas, incluindo estado deprimido, durante dois anos, no mínimo;
3) Depressão maior: 5 ou mais sintomas por duas semanas ou mais, incluindo estado deprimido ou anedônia.

Alguns fatores de risco para depressão:
- História familiar de depressão
- Sexo feminino (pois é)
- Idade mais avançada
- Episódios anteriores de depressão
- Parto recente
- Acontecimentos estressantes
- Dependência de droga

E ainda a disfunção neuroquímica, muito provavelmente uma disfunção do sistema serotonérgico:

“A depressão é uma patologia que atinge os mediadores bioquímicos que agem na condução dos estímulos através dos neurônios que possuem prolongamentos que não se tocam. Entre um e outro, há um espaço livre chamado sinapse absolutamente fundamental para a troca de substâncias químicas, íons e correntes elétricas. Essas substâncias trocadas na transmissão do impulso entre os neurônios, os neurotransmissores, vão modular a passagem do estímulo representado por sinais elétricos.
Na depressão, há um comprometimento dos neurotransmissores responsáveis pelo funcionamento normal do cérebro.”



Desde então, e com base nos diagnósticos feitos pelos Psiquiatras, oscilo entre a Distimia e a Depressão Maior. Bom, não importa como é chamada, ainda assim é um problemão.


O pior é que o sentimento de inadequação e desconforto agigantam, me fazendo perder prazer ou interesse por coisas que me davam tesão de fazer, ver, conhecer. Me isolei socialmente, querendo só ficar em casa, sem receber visitas ou atender ao telefone nas minhas piores fases. Por isso devo desculpas a alguns amigos, ex-namorados e pessoas pelas quais tenho a maior consideração do mundo, por deixá-los na mão em alguns momentos. No dia do meu último aniversário um grande e fenomenal amigo me ligou me parabenizando, e nós combinamos de nos encontrar no evento de Cinema que estava rolando por aqui. Eu não fui. Não tive coragem. Congelei. O deixei me esperando sem entender o que aconteceu, enquanto eu não havia nem saído de casa. Fiquei com medo. De me expor, de ficar chata, sei lá. Fugi.


Depressão não é só tristeza.
É uma doença, recorrente, que precisa de tratamento. Não desculpa as ações ou a falta delas, mas explica muita coisa. Eu tenho a imensa sorte de contar com amigos que não desistem de mim, por algum estranho motivo. Me cutucam, me ligam para um oi, me mandam mensagens de carinho. Tem muita gente boa por aí, e por aqui.


Acredito também que dei sorte com meu atual Psiquiatra. Tanto as conversas com ele quanto a medicação, surtem efeitos positivos. Eu sei que o processo é longo, a doença é recorrente, e virou assunto deste post para, se possível, ajudar alguém a procurar ajuda. Procure um Psiquiatra de confiança – se não concordou com o diagnóstico, troque. Fique em contato com os seus sentimentos para entender como as coisas acontecem de seu modo particular, pois cada caso é um caso. Busque grupos anônimos específicos espalhados pelo país, encontre pessoas que passam pelo mesmo problema, faz uma diferença enorme.

Para os amigos, estou bem.
Para os inimigos, que por algum motivo não querem me ver numa boa, azar o de vocês: eu estou bem.



Beijo grande.


Alguns links:
http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?137
http://www.tj.sc.gov.br/institucional/diretorias/ds/enfermagem/dicas/depressao.htm
http://www.portalnatural.com.br/mostramateria.asp?codigodamateria=27
http://www.neuroticosanonimos.org.br/

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postado por Aleksandra Pereira às 2:02 AM |


15 Comentários:


At sábado, novembro 24, 2007 3:20:00 AM, Anonymous Anônimo 

Rá!
O do abração, sou eu! sou eu!

Abração, boquita.

At sábado, novembro 24, 2007 12:50:00 PM, Blogger Sandman of the Endless 

é bom saber que você está bem! =)
beijão!

At sábado, novembro 24, 2007 1:42:00 PM, Anonymous Anônimo 

Bom ver você de volta, Aleksandra. :)

At domingo, novembro 25, 2007 1:06:00 PM, Blogger Marcia 

como vc, eu tomo um antidepressivo todo santo dia.
como vc, eu tenho problemas, que foram detonados por situações complexas que não cabem relatar aqui.
como vc, eu vou a um psiquiatra, que me acolhe e me faz ver a vida.
como vc, eu sei que a vida é difícil e que só quem está no olho do furacão pode medir.

a questão é que muitas pessoas não têm coragem de enfrentar seus monstros interiores. e vc tem.
então, vc é alguém com muito valor.

e a vida está aí, para ser vivida em seus ciclos.
as pessoas sabem respeitar, entender e esperar.
as que não sabem... bom, estas a gente deixa pra lá. estas têm outras prioridades, não estamos em seus planos, e elas não estão nos nossos.

At domingo, novembro 25, 2007 7:08:00 PM, Blogger Aleksandra Pereira 

Maurício, você é um amigo querido, e sabe disso. Nos conhecemos pelo blog e tive a sorte de descobrir um homem inteligente, educadíssimo e preocupado - no bom sentido.

Beijo grande, minino abraçador!

At domingo, novembro 25, 2007 7:09:00 PM, Blogger Aleksandra Pereira 

Ed,
estou bem sim, obrigada pela força que manda daí.

beijão.

At domingo, novembro 25, 2007 7:09:00 PM, Blogger Aleksandra Pereira 

Ina,
te respondi pelo Yakult, e repito aqui: valeu pelo carinho!

beijo grande.

At domingo, novembro 25, 2007 7:17:00 PM, Blogger Aleksandra Pereira 

Pinta, Pintinha,
chega uma hora que a gente satura com essa nossa comiseração, e satura com vontade de sacudir prá longe. Uma das coisas que me atrapalharam prá caramba na doença,não sei se acontece com a maioria, é a questão de saber qual era o problema, saber o que eu poderia fazer para melhorar a minha situação, mas não ter forças, vontade, de sair do lugar. A sensação é de uma mola interna quebrada, danificada o bastante para impedir continuar o movimento, sabe?

A terapia, as conversas que ouço nos grupos de apoio, o que eu mesma coloco para fora dando depoimentos, agora por aqui, ajudam a clarear as idéias, e fazem crescer a vontade de encarar os monstros de frente.

A batalha é diária, tanto para depressão, para quem tem problemas com álcool, com drogas e outras doenças. É olhar o negócio de frente e escolher dominar ou ser dominado por ele. Tem dia que a gente ganha, tem outros que se deixa perder por faltar ânimo.
Mas o outro dia não tarda a chegar, e então a gente se programa mais 24 horas de serenidade, não é mesmo?

Beijo grande!

At segunda-feira, novembro 26, 2007 12:25:00 AM, Anonymous Anônimo 

Coragem, amiga. Você consegue! Estamos aqui!
beijo,menina

At quarta-feira, novembro 28, 2007 4:55:00 PM, Blogger Vivien Morgato : 

saudades de vc, querida.
Fica firme.

At segunda-feira, dezembro 03, 2007 11:59:00 PM, Blogger Ana 

Vim aqui algumas vezes e tentei comentar... Mas não saiu nadinha...

Minha mãe é bipolar, então tenho a experiência de conviver com alguém que sente esta tristeza e este desamparo sem conseguir reagir...

O que eu gostaria de dizer é que, felizmente, há novos medicamentos, terapias e uma compreensão melhor da doença do que há 40 anos atrás.

Há muita coisa que vc pode fazer, mas, acima de tudo, tenha a conciência de que tem cura, tem tratamento e acalma teu coração. A alegria e a força estão dentro de vc, mesmo que, em alguns momentos vc quase desacredite nisso...

Um grande beijo. Te cuida direitinho.

At sábado, dezembro 08, 2007 12:32:00 PM, Blogger Telejornalismo Fabico 

*



é isso aí: faxina na casa e vc como rainha absoluta do lar.
ou como generala, a definição pouco importa, desde que esteja no controle.

bem-vinda.




*

At quinta-feira, janeiro 24, 2008 3:41:00 PM, Blogger Unknown 

Aleksandra! Depois de um longo e tenebroso inverno, eis que volto a visitá-la. Por que sumi? Não sei, não me lembro. Acontece. Achei muito bonito e corajoso o seu texto. E me deu o que pensar. Não me sinto triste, mas não descarto a possibilidade de ter depressão. Depois de ler o teu post, fiquei pensando nisso. Há sentimentos e sensações recorrentes que identifiquei na lista. Eu sou das pessoas que sempre associei depressão com tristeza. Obrigado!

At sexta-feira, janeiro 25, 2008 10:43:00 PM, Anonymous Anônimo 

Alek., parabéns pelo retorno, parabéns pelo lindo blog, parabéns pelo jeito incrível de escrever... Olha, qdo eu crescer quero saber escrever assim tbém! kkkkkkkk
Obrigada pelo carinho do link do Santo Blog!
Oba!
Apareça sempre, viu?
Eu venho tbém...
Vamos trocando figurinhas, certo?
Um bjo e muito Axé!
Santinha

At sexta-feira, fevereiro 01, 2008 10:13:00 AM, Blogger Onde não estou... 

Pois é Aleksandra...
Dei com o teu blog por acaso e também tenho em mim a porra da distimia.
É mau... muito mau!

Muita força para ti que eu também me vou aguentando.



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