quarta-feira, maio 03, 2006
“O MEU DESTINO É SER STAR”
Altair era ladrão. Não dos largamente reconhecidos em noticiários de plantão, nem desses que volta e meia estampam as colunas policiais – era sempre o que ficava para trás nas fugas, o mais devagar, o das costas mais frias.

Ele bem que tentava levar uma vida digna, mas sua preguiça em levantar cedo o fazia inventar as mais variadas desculpas aos empregadores, que as aceitavam até o limite aceitável. Sonhava em ficar rico e famoso, mas a única pessoa que assumidamente o conhecia era dona Idalina, sua mãe - e mãe a gente não conta.

Mas Altair precisava de dinheiro para montar o barraco dos sonhos de sua mulher, Sandra Rosa Madalena, que ganhara esse nome em homenagem ao homem que crescera acreditando ser seu pai; a mãe não confirma ou nega, mas não abandona o retrato autografado já roto, escondido sob o colchão.

Sem nada para fazer nem dinheiro para gastar, passeando com a esposa, Altair um dia notara o brilho de satisfação nos olhos de Sandra Rosa admirando um sofá exposto numa vitrine. Seu olhos brilhavam mais do que fogos pipocando na noite do Morro do Chacrinha. Sabia que sua nega já se via sentada naquele sofá, na sala de casa, recebendo as vizinhas roxas de inveja, enquanto a mãe punha na vitrola um disco do Magal.

A saideira. Altair promete ser esta a última vez em que se mete em roubada, delirando ao pensar na felicidade de sua mulherzinha. Será hoje à noite.

Sandra Rosa Madalena está em casa, cansada após lavar tantos cabelos em seu pequeno e alugado salão. Liga a diminuta TV, comprada em prestações – “Mas é minha” – e se acomoda no velho sofá ao lado da mãe e da sogra, que cochila. Mas num pulo, aos gritos, Sandra Rosa e as duas mulheres vêem no noticiário local um sonolento e assustado Altair, escoltado por dois policiais:

A polícia respondeu a um chamado de arrombamento nesta loja de móveis aqui do centro, e encontraram o provável criminoso, Altair José dos Santos, 27 anos, dormindo em cima de um tapete. Dormia tão tranqüilamente que o barulho dos roncos guiara os policiais até os fundos da loja”.

- Seu Altair, por que o senhor invadiu a loja de móveis?, perguntou uma sardenta repórter.

- SANDRA ROSA, MINHA NEGA, EU FIZ BESTEIRA MAS FOI PRA TU, PAIXÃO, EU JURO!, apelou Altair.

- O senhor agia sozinho?

- Por que foi pego dormindo?

- Como levaria o sofá para casa?

- O senhor se arrependeu?

Altair não responde. Flashes explodem enquanto repórteres aguardam ansiosos, o aviso de “AO VIVO” piscando na lateral da tela, Sandra Rosa sem saber se socorre a sogra ou enfarta.

- Seu Altair, não tem mais nada a dizer?, - aguardavam câmeras, gravadores e microfones.

Altair, pingando suor, ensaia um sorriso amarelo.

- Tenho, sim senhora. (...) MÃE, EU TÔ NA GLOBO!!!!


Texto inspirado em nota divulgada no UOL TABLÓIDE.

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postado por Aleksandra Pereira às 3:00 PM |


5 Comentários:


At quarta-feira, maio 03, 2006 11:25:00 PM, Anonymous Anônimo 

Adorei, Alê. Os textos estão cada vez mais saborosos.

Bjs

At quinta-feira, maio 04, 2006 8:37:00 AM, Anonymous Anônimo 

Hahahahah...a tragédia virou comédia! Gostei. É o tipo geral do brasileiro preguiçoso e azarado!

At quinta-feira, maio 04, 2006 2:16:00 PM, Anonymous Anônimo 

Alek,
adorei.
Tô montando um blog, depois mando link.

beijo

At quinta-feira, maio 04, 2006 3:00:00 PM, Blogger Andréa 

Haha, que gracinha o Altair e a Sandra Rosa, Alek. E a foto ta tao bunitinha! He! Adorei. Parabens pelo talento de sempre!

At sexta-feira, maio 05, 2006 4:52:00 PM, Anonymous Anônimo 

Se eu fosse escritor, organizaria um livro de crônicas, reunindo o melhor que tenho encontrado nos blogs da vida (parafraseando Milton). Você, COM CERTEZA ABSOLUTA, estaria entre os autores escolhidos. He he he! Sabe, pretendo criar um outro blog para escrever algumas crônicas lá. Só escrevi uma crônica em toda a minha vida (www.catanduvanarede.com), mas como gosto muito do gênero, pretensiosamente vou me embrenhar na matéria.



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